Sunday, March 30, 2008

UMA PEQUENA FICÇÃO DE DOMINGO

Era uma vez um miúdo hiperactivo. 
Acordava de vinte em vinte minutos com ganas de ver sombras na parede. 
Torcia o pescoço para ver tudo à sua volta. 
Tirava o lençol e os cobertores das pernas com pequenos e fortes pontapés. 
Agarrava a chucha para fazer sons inacreditáveis que se assemelhavam a cânticos ciganos com um pouco de fado à mistura. 
Tudo se esperava desse miúdo. 
Que crescesse depressa e bem, que fosse inteligente, porventura doutor ou arquitecto, pianista, de boa índole, com bom carácter e recto. 
Ele, por ora, só se interessava em sombras na parede e em que dançassem com ele ao espelho. Ria-se que nem um miúdo se ri. Soltava gargalhadas. 
Porque as cólicas já tinham passado tinha um misto de tranquilidade adulta e de hiperactividade infantil. 
Quando se chateava, torcia-se todo e tentava chorar, mas só conseguia ficar muito vermelho. Dava gritinhos quando não via os pais no ângulo de visão ou quando o punham no tapete de actividades com todas as músicas ligadas ao mesmo tempo. 
Esse miúdo não imaginava, e ainda bem, tudo o que esperavam dele. 
Bastam-lhe as sombras na parede e que dancem com ele ao espelho. 

1 Comments:

Blogger Trendy Jorge said...

Nada se espera dele, a não ser que seja feliz (... e, já agora, rico)!

9:41 AM  

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